26 de novembro de 2003

Não se preocupem, continua tudo bem!

Hoje o país não foi contemplado com a organização da America’s Cup, com que já contava, um pouco à maneira do ovo no cu da galinha. Mas o mesmo aconteceu com as cidades de Marselha e de Nápoles que talvez tenham feito menos alarido sobre o assunto. Valência foi a contemplada e será para ela que serão encaminhados turistas, dólares, acontecimentos, empresas e postos de trabalho.

Por cá, começaram as acusações recíprocas dos nossos inefáveis políticos. Quando o ministro Arnault decidiu acabar com a Docapesca e dar mais um contributo pessoal para o número de desempregados, alegou que aquela zona da cidade precisava de ser requalificada e, de cátedra, proclamou que isso era bem mais importante do que meia dúzia de obsoletos barcos de pesca e três dezenas de pescadores iletrados e descalços que poderiam facilmente ser realojados em qualquer acampamento cigano.

Com lágrimas de crocodilo a oposição vociferou que a decisão castigava os mais pobres, – nunca vi nada que tivesse sido de maneira diferente, mas está bem! – que criava desemprego e que privava os pescadores de um porto de abrigo. Convocou jornais e emissoras de rádio, marcou conferências de imprensa para a hora em que a D. Manuela Moura Guedes, de boca aberta, nos gritava pela casa dentro as últimas tragédias do mundo. Ninguém os ouviu ou os informou de que o tempo de antena acabara. Os operadores de câmara limitaram-se a desmontar o equipamento, a carregá-lo na parte de trás do veículo todo o terreno e a irem-se embora.

Hoje, depois de divulgada a escolha, a partir de Genebra, o governo comoveu-se tanto que o ministro Arnault chegou às lágrimas. Puxou de um lenço imaculadamente branco que trazia no bolso do casaco, limpou as lágrimas e secou o pingo que ameaçava cair-lhe do nariz. Depois disparou dizendo que o governo fizera tudo o que estava ao seu alcance para trazer a prova para o país, que tínhamos as melhores condições e a melhor vista para a baía. Mas que o mal vinha de trás, dos governos anteriores, que tinham cedido à despesa sem controlo e que nada tinham feito no sentido de que Lisboa fosse, por mais longo período, local de residência permanente do Sr. Patrick Monteiro de Barros. E nisto Lisboa e Cascais são uma e a mesma coisa, é tudo tão perto, vencida sem acidente a curva do restaurante Mónaco, o resto é um tirinho.

A oposição não perdeu tempo a salientar que o acontecimento nos iria tirar do rabo da Europa, o salário mínimo iria equiparar-se ao que vigora em Espanha, o Dr. Bagão teria que recuar na sua intenção de reduzir os montantes dos subsídios de desemprego – para acabar com os desempregados! – e de doença – para acabar com os doentes! – e seríamos um país feliz e contente, de gente inteiramente ocupada e saudável. Sem digestões mal feitas e sem cálculos na vesícula! Mas que isso não iria acontecer porque o governo se não empenhou, não fez pressões quando e onde devia e o deputado Lello falou mesmo na debilidade dos “lobbies” que não sei o que é.

Mas calma! Quando as regatas estiverem a decorrer creio que sempre se arranjará algum trabalho político que possa ser feito em Valência. Mesmo que ainda me recorde de ouvir a minha avó dizer que “de Espanha nem bom vento, nem bom casamento!”.

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