30 de novembro de 2003

Temos a memória curta e convencimento longo

Hoje regressei a casa, ao segundo dia de um fim de semana prolongado, de três dias. Era isso que estava previsto. O que não estava propriamente previsto, no meu boletim meteorológico, era o tempo desgraçado que tem feito. Embora, muito provavelmente, o estivesse no boletim oficial, emitido pelos únicos serviços com credibilidade para o fazerem: os de meteorologia.

Mas adiante, correu tudo bem, até a ida à Praia de Vieira de Leiria para almoçar. Devendo salientar-se, em todo o caso, que mesmo apesar da muita chuva foi possível e fácil ver grandes áreas de pinheiros pertencentes às repetidamente assinaladas “Matas nacionais”, ardidos durante o último Verão e que, independentemente da idade, continuam de pé, embora mortos. Portanto o Estado que temos dá-nos, como sempre, o exemplo. Mau, como sempre também, para que nos continuemos a questionar sobre a sua capacidade para servir de exemplo a seguir seja no que for. E que, cada vez com maior frequência, nos perguntemos para que é que, de facto, serve o Estado. Às vezes dou por mim a dar razão ao governo – em sentido abstrato – quando afirma que temos Estado a mais. E, indiscutivelmente, temos. Em tudo e sistematicamente. Porque sempre que intervem o faz mal e porque sempre que deveria intervir pura e simplesmente se abstem e se demite das responsabilidades que deveria assumir. Do poder, não, desse não se demite. Cada ministro, cada secretário de estado, cada vereador, cada presidente de junta tem o cuzinho colado à cadeira com Araldite, aquela que servia para colar cientistas ao tecto, de cabeça para baixo. Lembram-se dessa cola?

Mas, outra vez, adiante. Com pompa e circunstância – e com chuva, bem o espero! – realizou-se hoje em Lisboa o dito sorteio da fase final do Euro 2004 do nosso descontentamento. De sorteio aquilo teve muito pouco e toda a gente o sabia, é quase igual ao sorteio dos árbitros para os jogos da nossa pretenciosa superliga. Entram todos no pote – o termo é fixe, com o tempo há-de haver uma certa honestidade e acabar mesmo em tacho – e depois excluem-se os que são do Porto, do Benfica, do Sporting e do Boavista. Os do Guimarães deixam-se ficar mesmo que o Dr Pimenta Machado reclame. Os do Algarve também podem ficar: o Algarve não tem futebol e para lhe inaugurar o estádio teve de se lhe enviar um futebolista amador que até é profissional do governo. Se o Sr. Major não gostar de barbudos, por causa da concorrência, excluem-se também. E os carecas, os coxos, os divorciados, os canhotos, os adventistas do sétimo dia, os seguidores do auto-proclamado bispo Edir Macedo também se excluem. Ficam dois, faz-se o sorteio, rigoroso, isento, honesto. Depois de terem sido todos incuídos no pote.

O sorteio de hoje começou por chamar cabeças de série a quatro selecções. Depois forte mais a outras quatro, apenas forte a mais quatro e forte menos às restantes. Em teoria uns são mais fracos do que outros que são exactamente iguais aos que são considerados mais fortes do que eles. Mas pronto, já se sabia que era assim. Connosco pernoitam a Espanha, a Grécia e a Rússia. E os nossos jornalistas, que são mais adeptos do que profissionais de informação, exultam. Fazem demonstrações do português inovador e criativo que fizeram com o Sr. Gabriel Alves. Inventam, disparatam, asneiram, fazem pela promoção à categoria profissional que se segue nas suas carreiras. Meu caro amigo Ribeiro Cristóvão deixa lá a assembleia, não vais aprender lá nada, regressa à tua Renascença, estás perdoado.

O nosso grupo, adiantam os nossos jornalistas e garantem-no os nossos comentadores, é acessível. O único senão é a Espanha mas como com eles é o último jogo, nem tem importância. O que aconteceu em Guimarães, se é assunto da actualidade é melhor perguntarem ao Dr Pimenta Machado que ele é que é de lá. Se for histórico, isso sim, sabemo-lo todos, foi dali que partiu D. Afonso Henriques, à conquista. A Grécia, ora a Grécia. A Grécia é mais velha do que a sé de Braga, tem umas ruínas que são quase tão bonitas como as de Évora, só um bocado mais velhas. Até há bem pouco tempo até na União Europeia iam atrás de nós, o que é coisa bem difícil. De resto? De resto o quê? Mandaram o Eng. Fernando Santos embora porque se viu grego para os entender. Mas ele também se vê grego com pouca coisa: já se tinha visto antes grego no Porto e agora lá se vai vendo grego no Sporting. Por pouco tempo, espera-se! Mas depois há-de ver-se grego noutro lado qualquer!

Ainda o ano passado, quando do mundial da Coreia-Japão, o nosso primeiro pediu aos rapazes, quando se foram despedir dele, que lhe trouxessem a taça. Eram favas contadas. O grupo nem era fraco. O grupo em que calhámos, com vossa licença, era uma grande merda. O Oliveirinha – lembram-se dele, o da desinteressada Olivedesportos, o seleccionador? - mandava os adjuntos para o banco, ele ia curtir a ressaca da noite anterior, estava no papo. Deu-se ao luxo de prescindir do guarda-redes titular que não era preciso sacrificar e mandou o Baía, com uma carreira brilhante feita em Barcelona e nas demolidas piscinas das Antas a curar lesões. Então quem, nas apostas, arriscava um tostão – bom tempo, o dos tostões! – furado nos Estados Unidos, na Coreia e mesmo na Polónia? Naturalmente, ninguém. Foi o que se viu, todos eles nossos amigos, mandam-nos de regresso a casa mais cedo para que a federação do Dr Madail pudesse poupar nas despesas obedecendo à política pragmática – termo bonito este, gosto muito! – da Dra Manuela Leite. Para o ano, vamos a ver. Nos estádios, não poupámos. No convencimento – viu-se logo hoje, no dia do sorteio – também não. Vamos a ver no resto! Mal ou bem, gostando ou não dele, por uma vez ouço o Sr. Scolari. O nosso objectivo não é ganhar à Grécia, nem à Rússia, nem sequer à Espanha. O nosso objectivo é passar à fase seguinte!

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