25 de março de 2004

Portugueses descontentes com centros de saúde

Os portugueses são muito dados aos estudos, que não ao estudo. São coisas diferentes! Na escola, quando deviam entregar-se voluntariosamente ao estudo da aritmética, do português, das ciências naturais, não o fazem. São matérias que lhes dão cãibras quando adolescentes e uma sonolência profunda quando adultos. Ainda hoje não há nada melhor para que um gajo se passe para o outro lado do que pôr-lhe à frente a fórmula de resolução da equação quadrática ou sentá-lo, muito concentrado, a ver as novelas da TVI.

Já quanto à realização de estudos a perspectiva é diferente. Por completo. Os portugueses fazem estudos em barda que, todos juntos, não servem para nada. Juntam dois ou três jovens, pagos a quinhentos escudos à,hora sem recibo,- como o Dr Portas fazia na Universidade Moderna, em defesa da igualdade de oportunidades - mandam-nos para a Rua de Santa Catarina a uma qualquer hora de ponta, fazem-nos correr atrás das pessoas apressadas que passam a caminho do almoço ou de regresso a casa, colocar-lhes meia dúzia de perguntas rápidas e imbecis que não travam a pressa mais que dois minutos. Depois metem a simples centena de respostas obtidas, intercaladas com todos os "não me chateie" que as acompanharam, num computador construído a partir de componentes importados de Taiwan e extraem conclusões sobre toda a área metropolitana do Porto. Com uma margem de erro sem expressão acabam a concluir que toda a gente adora o presidente da câmara, acha o metro do Porto o sistema de transporte mais eficiente do mundo e o Futebol Clube do Porto, definitivamente, maior que o Leixões.

Ainda hoje o Jornal de Notícias escreve em título "Utentes não estão satisfeitos com os centros de saúde", referindo-se a um estudo realizado pela Deco em Junho e Julho do ano passado, como se fosse necessário fazê-lo para chegar a tão brilhante conclusão. Ali se diz que um terço da população espera um mês por uma consulta do seu médico de família, quando o tem. Em Espanha isso consegue-se de um dia para o outro. Se a consulta for de especialidade a situação complica-se e a espera alarga-se para o dobro do tempo: dois meses. Se for no Algarve, apesar de Espanha ficar logo na outra margem do Guadiana, a questão piora ainda mais. No dia da consulta, cuja chegada é logicamente festejada com bolo-rei, espumante da Bairrada e foguetes, a espera ronda as duas horas. Em instalações que em nada se parecem com o gabinete de nenhum ministro, sem luz, sem ventilação e, quase sempre, sem cadeiras.

É de enaltecer o trabalho da Deco? Claro que é, a começar desde logo pelo número de inquiridos: cerca de cinco mil. Em relação a 2000, três anos antes, as coisas melhoraram? Não se dá por isso! O ministro da saúde vai olhar para os números? Vai chamar ao seu gabinete os responsáveis da Deco para melhor se esclarecer? Claro que não! Vai continuar a falar no sucesso das listas de espera para as cirurgias: dos que estavam inscritos há dois anos já ninguém espera. Os que não foram operados, morreram. Daí para cá ninguém mais se inscreveu, o país passou a ser saudável. Ou medroso. Quem dava cabo da saúde dos portugueses era o engenheiro Guterres, já ninguém sofre de almorróidas ou toma Prozac para se sentir feliz. Ou, então, já há mais medo da cura do que da doença!

Entretanto é isto que permite ao Hospital de São João, S.A. gastar mais de cinco mil contos a fazer publicidade a si próprio, como se se masturbasse. Como aqui, num outro "post", referimos ontem. São os sinais da retoma já claramente visíveis por aquelas bandas. O dinheiro já sobre onde sempre faltou. Gasta-se é mal e naquilo em que se não deve. O que espanta é que ninguém seja responsável por coisa nenhuma. Mesmo que o ministério não tenha tido conhecimento prévio da iniciativa, o ministro acabará a louvar tão proficientes gestores. E a propor mesmo que sejam condecorados no 10 de Junho.

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