24 de agosto de 2004

Rui Rio é um bom patrão...

O jornal é de todo insuspeito. O seu director é igualmente insuspeito. O articulista, por maioria de razão, será ainda ele insuspeito. A notícia nem é preocupante, nem alarmista, nem coisa nenhuma. É mais aquilo com que as pessoas há muito deixaram de se surpreender ou de mostrar admiração. É um corriqueiro facto quotidiano, sem nenhuma importância, que não compromete a continuidade do país nem o orgulho nacional. E que nem sequer determina a falência da Câmara Municipal do Porto, como se fosse um simples lugar de venda de hortaliças no centenáro Mercado do Bolhão.

Câmara Municipal do Porto: o exemplo a seguirAssessor de Rui Rio tem ordenado superior ao do Presidente da República. Pois, e daí? A mui nobre, leal e sempre invicta cidade do Porto não é, com o devido respeito, a segunda cidade do Biafra. É, com muito orgulho e o perfeito domínio do futebol profissional nas últimas duas décadas, a segunda cidade deste imenso Portugal que ainda há-de cumprir seu ideal. Membro, de pleno direito, da pujante União Europeia, liderada pelo também insuspeito José Barroso, também conhecido por Durão Barroso, actualmente com gabinete em Bruxelas e casa de praia no barlavento algarvio. Que há-de ser dentro de dez anos, segundo em tempos se decidiu em Lisboa, o maior e mais competitivo mercado do mundo, incluindo o Afeganistão, o Bangladesh e a Palestina.

Parece que até há uma disposição legal qualquer a fixar o ordenado do Presidente da República em 6.879,94 euros, - o equivalente a cerca de 1.380 contos - ou seja cerca de 19 salários mínimos nacionais. Parece também que esse mesmo dispositivo estabelece os ordenados dos profissionais da política em função do do Presidente da República, também por vezes designado eufemisticamente por mais alto magistrado da nação, apesar da estatura meã. Parece ainda que ao abrigo das mesmas disposições legais o presidente da Câmara Municipal do Porto ganha actualmente 3.793,87 euros, - o equivalente a cerca de 760 contos - ou seja pouco mais de dez salários mínimos nacionais. Parece!

Porque o benemérito Rui Rio trabalha afincadamente para que no fim do mandato lhe erijam estátua no Passeio Alegre e lhe dêem o nome a uma travessa qualquer do Bairro da Pasteleira. Não quer nada para si, tanto que prefere dá-lo aos outros. O seu chefe de gabinete, por exemplo, ganha 7.242,84 euros, - o equivalente a cerca de 1.450 contos - ou seja cerca de 20 vezes o salário mínimo nacional. O que, se a aritmética não for uma batata importada de Espanha, permite concluir que ganha cerca de duas vezes mais do que o patrão. O que acaba por ser um precedente perigoso, caso os activos sindicatos que enxameiam o labirinto laboral se venham a aperceber da situação. E exijam ao engenheiro químico dos hipermercados que passe a pagar a cada operadora de caixa mais do que ele próprio leva para casa ao fim de cada mês para sustentar a mulher e educar os filhos.

Por mim, no mínimo, fico intranquilo com a situação. A menos que o ideólogo Luís Delgado venha a dedicar ao assunto, por um destes dias, a elevação do seu pensamento e a profundidade da sua escrita. No sentido de me esclarecer e mais do que isso para me restituir a tranquilidade. A ver se alivio o ministro da saúde da sua esforçada e dispendiosa comparticipação no famigerado Xanax com que adormeço.

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