31 de março de 2005

Coisas estranhas

Em termos de política partidária, em Portugal, acha-se tudo estranho e extemporâneo. Nunca nada se considera normal, vê-se a maquinação maquiavélica por detrás de tudo, dão-se largas a histórias da carochinha a que falta o requinte das ilustrações feitas à mão. Além disso nunca nada acontece no momento certo ou adequado. Todas as oportunidades são manipuladas na procura de inconfessáveis vantagens, os relógios são culpados pelos atrasos e pelos adiantamentos, é-se preso por ter cão e por não ter. Desde logo basta que existam cães, uma espécie de que se deveria propor a extinção por decreto.

O suspeito A foi inquirido no âmbito do processo da Casa Pia? Então foi-o com evidentes propósitos políticos. Porque se aprestava para anunciar o seu apoio a um candidato a uma ignota junta de freguesia, porque a ex-mulher desempenhava o cargo de assessora no ministério X, porque o filho era tesoureiro de uma secção da juventude qualquer coisa e, ainda por cima, namorava com a filha do inimigo. Com quem, por razões éticas, ainda não partilhara a cama e o chuveiro.

O suspeito B esteve na Polícia Judiciária a prestar declarações para o processo do apito oxidado? Não se aceita que isso tenha acontecido quando o presidente do clube Y tinha intenções de pagar a primeira prestação da dívida à segurança social. Muito menos quanto estava quase acordado o segundo encontro do ano a disputar no estádio do Algarve, entre funcionários das autarquias de Faro e de Loulé. E ainda menos, dois dias depois de o avião que transportava Rui Costa e a respectiva família ter tido forçado a aterrar de "barriga" no regresso de umas curtas e merecidas férias no ancestral vale do Nilo.

O suspeito C foi inquirido no âmbito de um vultuoso processo de contrabando de tabaco? Porquê? Sabendo-se que nem sequer é fumador, que desde sempre foi temente a Deus, que vai regularmente à missa e nunca se recusou a contribuir generosamente para as festas da freguesia. Tendo-se verificado que as embalagens de tabaco não dissimulavam cocaína, ecstasy ou mesmo aves ou animais de origem tropical e que já prometera apoiar o sim no referendo sobre a dita constituição europeia, se esta vier a existir e aquele a realizar-se.

Hoje, se é assim, a concelhia do PSD de um sítio qualquer, algures a sul, entre Lisboa e Cascais, - e não digo mais para que a incerteza persista! - achou estranho que tivessem sido visitadas instalações da autarquia e a residência do anterior presidente da câmara. Certamente com mandado judicial, estranhando-se também os motivos que terão levado um qualquer ignorado magistrado a assinar o papel. Que procuravam em qualquer dos locais, especialmente depois de sua excelência ter ontem assistido ao empate na Eslováquia, jantado em família e passado o resto da noite a ver um filme de Clint Eastwood? Por acaso suspeitam que são de contrabando os charutos que fuma, a única coisa cubana que até hoje suportou, para além de uma passadora da equipa de voleibol feminino que, todavia, era excessivamente alta no seu metro e oitenta? Ainda por cima antes de sua excelência ter completado a sua cuidadosa higiene matinal, envergado o seu habitual roupão de veludo cor de laranja e tomado lugar à mesa do pequeno-almoço, bebericando café com leite e mastigando algumas torradas feitas com pão do dia anterior. Sabendo-se que amanhã é sexta-feira e a seguir sábado. E o domingo é dito de pascoela?

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