28 de novembro de 2006

Zelda Valadas

Mesmo que o comentário venha envolto no manto do anonimato, frontalidade que não perfilho, transcrevo com a devida saliência as palavras de Zelda Valadas(?). Redescoberta que seja a gramática do Sr José Relvas, talvez eu volte aqui. Com o mesmo espírito do "escrivinhador" que não aspira a prémios, que não frequenta o Guincho, que não cobra direitos de autor. E que aqui exerce - como tal e por enquanto! - a única liberdade que o mesquinho país lhe confere. E, apesar de tudo, se diverte uma vez por outra. Finalmente, em mirandês vernáculo, "last but not least". Reconfortante é ter conhecido aqui e por esta via, pessoas cujo gabarito se situa quilómetros acima do meu, que pessoalmente ainda hoje não conheço e que nos passeios da cidade nunca teria encontrado!

Não digo que haja uma raiva contida em relação às mulheres, mas afinal qual o objectivo este escrito? Um mero exercicio de combinação de palavras? Dos quais se ririam se as vissem os Srs. V.Pulido Valente e Eduardo Coelho?
Nem o estilo nem o conteúdo se adaptam a uma questão tão dolorosa como o aborto!E é pena, porque se fosse tentado um estilo menos retórico, certamente sairia algo bem melhor!Porque as mulheres hoje e cada vez mais desempenham papeis que já nada tem a ver com a força bruta muscular e, felizmente, há homens que assumem frontalmente a defesa do aborto de forma não jocosa e muito pouco feminina.
Eu também não me sinto minimamente ofendida com as diatribes do Sr LVF,mas tão só entristecida com uma forma à la Pulido de Valente de abordar todos os assuntos.É pena, muita pena,mas os blogs também servem para curar frustrações e mutuas adulaçoes( não só os Abrupto e Causa Nossa). Lado Feminino? De quem?Santo Deus,e invoco o seu nome em vão,se este artigo tem o que quer que seja de sensibilidade feminina. E ainda bem. A verdade é que nem todos conseguem chegar a certas alturas de escrita e é pena, muita pena.
Chega-se sempre a algum lugar, mesmo que seja sempre ao mesmo lugar.
LIberte-se do srs Vasco e Eduardo, porque outros exemplos mais dignos tem neste momento para invocar em prole de despenalização do aborto.
Boa noite, Sr.Escrivinhador!

23 de novembro de 2006

O Homem

Finalmente hoje despojei-me da minha muita timidez, aliviei-me de algum contido recato e venho aqui, com a arrogância que se impõe, afirmar o meu incomensurável orgulho de ser homem. Por pior que as mulheres possam pensar, o homem é um ser superior. Mesmo quando à frente delas se reduz à figura grotesta de um símio, nu e de peúgas calçadas, tiritando ao frio do inverno e com toda a envergonhada virilidade escondendo-se sob o peitoril de um ventre melhor sucedido do que as finanças domésticas.

Alguma mulher, até hoje, ergueu a espada de D. Afonso Henriques ou sequer discutiu o seu peso? Alguma envergou uma armadura em ferro maciço, mesmo que debruada a lantejoulas e desenhada pela Fátima Lopes com o financiamento do Banif? Alguma mulher teve até hoje as namoradas que já teve Santana Lopes, a quem ainda sobrou tempo para desenvolver tácticas sobre o futebol, chefiar vereações e ser menino-guerreiro, pelejando pelas madrugadas fora nas mais recônditas alcofas? E mesmo assim ter percepções? Nem a Martina Lavratilova!

O homem é um ser superior, sem nenhuma dúvida. Basta ler Vasco Pulido Valente, engolir as crónicas de Eduardo Prado Coelho e acompanhar os blogues Abrupto e Causa Nossa. Já viram alguma mulher, mesmo rural, com uma barba parecida com a do José Pacheco Pereira? Já encontraram alguma professora universitária com a mesma habilidade que tem para a fotografia o professor Vital Moreira, sendo simultaneamente amigo do Dr Mário Soares e apoiante do governo? Registam os anais da história os feitos heroicos de algum general que, sendo do sexo fraco, ao menos usasse o apelido Bonaparte?

Mesmo a padeira Brites de Almeida não sabia manusear uma lança, apenas uma pá de enfornar pão com chouriço. Enganou-se na massa e enfornou uma dúzia de castelhanos, e mesmo assim com o chouriço de fora. Nem sequer os degolou, quanto mais comê-los, mesmo depois de saídos do forno, bem cozidos e de côdea estaladiça. Os homens sabem de tudo e muitos até sabem tudo! Quem mais sabe sobre o aborto - conhecido por interrupção voluntária da gravidez na escarpa dos Guindais e na Pedreira dos Húngaros - é o senhor cardeal pratiarca de Lisboa, a quem peço a benção, logo seguido pelo Dr Eduardo Prado Coelho. Do primeiro nem sequer reza o currículo que tenha feito muitos filhos e do segundo já não sei porque não frequento as festas da música no Centro Cultural de Belém.

Digam-me que mulher sabe alguma coisa sobre o aborto ou sobre a forma como se fazem filhos, usando preservativo e acautelando a disseminação do HIV? A Clara Ferreira Alves? Não brinquem comigo, leiam o Dr Prado Coelho. Sobre filhos sabe ele, quase tanto como sabe sobre os méritos do governo, a ignorância cultural do Dr Rio e a lingerie da senhora ministra da cultura!

12 de novembro de 2006

Modernização

Do seu cantinho rural, sentado à mesa habitual do Gambrinus, Vasco Pulido Valente assevera hoje que no país todos os responsáveis políticos, desde Afonso Henriques, falam em modernização. Tem razão! Para concluir depois que isso é apenas e só um sinal de impotência. Está errado! Pode não ser VPV um entendido em química, o que se lhe desculpa. Tanto mais que sempre foi muito mais dedicado às letras e à silvicultura, especialmente depois de ter herdado parte de um pinhal a norte do Cabo da Roca.

A impotência não é hoje um problema definitivo e irresolúvel como antigamente era, por exemplo, ser corno. Mesmo que se amputassem aos infiéis os instrumentos do pecado e que, de seguida, se liquidassem sumariamente, o estigma perseguia o atingido até ao juízo final. Não é assim com a impotência e, no caso do país, pode o engenheiro Sócrates não o saber porque, sendo engenheiro, não me consta que seja químico, embora venha praticando como aprendiz de alquimista. Para mais, uma qualquer manifestação do seu partido, incluída na feira anual de Santarém, nem sequer lhe testou essas capacidades ou tão pouco lhe exigiu que fizesse prova de vida.

Mas ele tem alguns assessores no seu gabinete. Poucos, mal remunerados, com pequenas ajudas de custo e carros de serviço daqueles que não exigem carta de condução nem motorista profissional, mas tem. E aí tem apoio para as áreas da ciência e, necessariamente, da química. Como tem sempre disponível o professor Mariano Gago no outro lado da linha telefónica que, cantando, lhe poderá revelar que para isso há o Viagra. Uma solução miraculosa que ergue os enfermos e ressuscita os mortos. O governo, honestamente, só precisa que um dos subordinados do ministro da saúde lho receite e lhe indique a posologia correcta. O que será um problema, vindo de onde vem!

11 de novembro de 2006

O Guiness

O país surpreendente foi ontem interrompido por uma questão de inigualável relevância, com alinhamento nos noticiários e convocação de conferências de imprensa. Noticiaram-no os orgãos de informação e reclamou-o o presidente: o Benfica passou a ser o maior clube do mundo, conforme certificado arquivado na Torre do Tombo e fotocópias afixadas nos locais públicos do costume, incluindo os balneários do estádio e as portarias das repartições de finanças. O exagero desculpa-se aos portadores de carteira profissional emitida pelo sindicato dos jornalistas, para quem a língua portuguesa é uma coisa que nem a Lili Caneças usa - o que aliás é verdadeiro! - e Fernando Pessa um velho e inútil antepassado de um cantoneiro do instituto de estradas que nunca ouviu falar no processo do apito dourado.

Bem vistas as coisas tão pouco será de o apontar como exagero ao presidente da colectividade, bem mais próximo da mecânica dos fluidos do que das regras da linguística. E, como quero acreditar, a semântica não é propriamente uma concorrente qualificada e credível da vulcanização. Mas que coisa heroica de facto aconteceu para que o país parasse ainda mais e o engenheiro Sócrates tivesse adiado o seu congresso para a hora a que abrem as discotecas? O Benfica foi reconhecido como o maior latifundiário do Alentejo abandonado? Ultrapassou fronteiras e demarcou metade da floresta amazónica para a cultura da banana e a caça das borboletas? Alcançou o décimo milionésimo título da sua história e foi agraciado pelo doutor Cavaco e pelo fantasma do professor de Santa Comba? Viu os seus lucros a crescer mais rapidamente do que a crise económica, à semelhança da EDP, da PT e da Brisa? Conseguiu completar três meses ininterruptos sem ver a sua baliza violada e sem que o senhor Simão Sabrosa tivesse mudado de penteado? Extinguiu os paraísos fiscais, reconheceu a independência da Madeira e fez coroar como imperador o australopitecídeo Alberto João?

Não, nada disso! Muito mais do que isso, conseguiu arrolar mais sócios do que o clube do engenheiro Sócrates e menos do que a igreja do bispo Macedo. E, mesmo assim, é aquele que nos desgoverna as finanças domésticas e este que nos saca o dízimo. Mais do que gerir a recauchutagem o senhor presidente do Benfica tem, obviamente, direito a governar o país!

6 de novembro de 2006

A justiça

Saddam Hussein, o pior exemplar que a humanidade já produziu, desde os tempos imemoriais em que ainda andava a quatro patas, se pendurava pelas caudas nos galhos de árvores centenárias e nem sequer Charles Darwin tinha nascido, foi ontem condenado à morte. A sentença colheu de surpresa meio mundo e deixou estupefacto o outro meio, por ter sido de todo imprevisível. Especialmente por ser decretada alguns anos depois de George W. Bush ter decidido que a democracia deveria ser instituída no Iraque, nem que para isso fosse preciso mobilizar bombardeiros para trabalhar por turnos e aos fins de semana. E, como se sabe, a guerra não teve sequer os episódios dramáticos que Raúl Solnado tão bem descreveu relativamente ao conflito mundial de 1914-1918. Tanto assim que mal uma fuga de informação deu conhecimento do seu início logoo presidente americano se aprestou a anunciar o seu termo e a sua vitória. Daí para cá o que de mais violento chegou a Bagdad foi uma imagem, benzida, da virgem de Fátima, com pombas e rosas brancas carregando-lhe o andor.

Hoje, com a habitual isenção e o rigor do costume, o jornal de referência dá-me maiores detalhes, o que se louva. Fica-se a saber que o monstro das cavernas, por incomensurável brandura da humanidade e complacência religiosa do sistema de Bush e Associados, Inc, foi condenado por um tribunal iraquiano. Onde nada, nem a língua usada no decreto que o instituiu nem tão pouco o apelido dos juízes, teve a mínima proximidade com nada que fosse ocidental, democrático ou americano. O apelido mais próximo dos inqualificáveis apelidos americanos era o muito latino, insuspeito e terceiro-mundista Fernandes cuja etimologia, por falta de subsídio da taberna do Dr Rui Rio, eu próprio desconheço e a ciência genealógica comodamente ignora.

E acho bem, até digo que acho mesmo muito bem, que o inqualificável energúmeno seja enforcado, de preferência duas vezes, a bem dos direitos humanos, da paz universal e da abolição da pena de morte. De preferência usando uma gravata de seda, expressamente encomendada para o efeito na mais requintada boutique da baixa novaiorquina. Para não mogoar tanto e não lhe deixar marcas de violência no pescoço!