3 de maio de 2012

Contradições da democracia



O vocábulo democracia é, só por si, um longo e nebuloso equívoco. Socorro-me de um dicionário vulgar, da Porto Editora, edição de 2010, incorporando já o acordo ortográfico: “sistema político em que a autoridade emana do conjunto dos cidadãos, baseando-se nos princípios de igualdade e liberdade”. Depois adianta dois conceitos opostos por simples 180 graus, direta: situação político-administrativa em que o poder é exercido diretamente pelo povo”. Democracia representativa: “situação político-administrativa em que o povo governa através de representantes seus, periodicamente eleitos”.

Reportemo-nos apenas ao sítio em que vivemos, enquanto aguardamos pelo visto para emigrarmos, não se sabe nem para onde, nem para fazer o quê. Mas como recomenda o senhor Passos Coelho e o seu governo regional. O nosso sítio é Portugal, de Vila Real de Santo António a Melgaço, incluindo a Porcalhota, a ilha do Corvo e o protetorado da Madeira, incluindo o pico do Areeiro e o Curral das Freiras. A democracia não é direta e, ignorância minha, essa situação não se verifica em lado nenhum. A democracia também não é representativa nem o povo governa através de representantes seus.

Primeiro estamos todos incluídos num caldeirão composto, para já, por 27 países e onde caímos como o joão ratão, que se chama União Europeia. E que, sendo uma ditadura, impõe a cada estado-membro ou candidato, que seja uma democracia. É mais ou menos como dizer que o branco é a ausência de todas as cores e, simultaneamente, a presença de todas elas. E o mesmo se diga do preto, porque é indiferente e a ordem dos fatores é arbitrária. E onde, cantando e rindo, temos andado convencidos de que viveríamos eternamente como uma ucraniana jovem a expensas de um industrial textil do vale do Ave, velho e falido, que pagaria o aluguer, a luz, a eletricidade e os preservativos, mesmo que desnecessários.

Depois a nossa democracia é exercida não através do povo, de que em tempos se disse que unido nunca mais seria vencido, mas através de organizações sem rei nem roque a que se convencionou chamar partidos políticos. E que a classe política, constituída pelo conjunto de cidadãos que vivem à conta do zé pagode, sem regras e sem horários, dizem ser essenciais. Acontecendo que cada um deles é menos democrático do que o Benfica, onde o voto do presidente em exercício não vale o mesmo do do sócio que pagou o seu bilhete, carrega uma bandeira, canta, grita e insulta os árbitros e as famílias.

Ainda hoje, no jornal que compro diariamente para ajudar o engenheiro Belmiro de Azevedo a superar a crise, um senhor chamado Eduardo Cabrita, certamente muito respeitável e menos respeitado, candidato a uma coisa chamada federação distrital do PS de Setúbal, se manifesta preocupado com a falta de credibilidade que está a rodear a vida interna do partido e anuncia a sua intenção de travar os “sindicatos de voto”, seja lá isso aquilo que for. E diz que apenas devem votar os militantes que tenham pelo menos um ano de inscrição partidária.

Muito democraticamente, como diz o dicionário da Porto Editora, baseando-se nos princípios de igualdade e liberdade. Mas pouco, apenas q.b. como nas receitas de culinária!

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